Elspeth Beard – A mulher que em 1980 aos 24 anos viajou sozinha pelo mundo.
A motociclista inglesa Elspeth Beard, hoje com 56 anos, residente em Londres/Inglaterra, inspira muitos motociclistas que curtem viagens ao redor do mundo. Várias revistas impressas e sites da Internet na Europa, Estados Unidos e outros países já fizeram matérias com ela. Ela é uma lenda viva no motociclismo europeu.
Até no Japão é conhecida, já que foi nesse país que fez dois documentários na TV dedicados a sua vida e trabalho.

Agora, pela primeira vez num veículo editorial de duas rodas brasileiro, uma matéria a respeito da fantástica história dessa mulher. Sem dúvida, é a mulher que mais viajou pilotando uma moto numa mesma viagem que o RockRiders.com.br já teve notícias.
Infelizmente essa matéria não é uma entrevista com a motociclista, a cadastramos nesse espaço do RockRiders.com.br, devido ao destaque que o mesmo tem. É a tradução e complemento com textos meus de uma história que foi publicada numa importante revista americana de motos, fundada em 1912, chamada Motor Cyclist.
Elspeth Beard em 1980 aos 24 anos de idade, percorreu utilizando uma BMW R 60/6 Flat-Twin de 1974 já usada com 48.000km rodados e realizou uma viagem por vários países da América do Norte, Europa, Ásia, Oriente Médio e Oceania. Nessa época, não existia boa parte das estradas que temos hoje na América Central e do Sul.
Depois dessa grande viagem que fez em 1980, ficando 3 anos viajando por 76.000km, realizou outras grandes viagens de motocicleta, inclusive numa delas, foi guia de mais de vinte e três motociclistas europeus, viajando por vários países do mundo por três meses.
E se você está pensando que Elspeth Beard é milionária financeiramente para poder ficar viajando de moto pelo mundo, está redondamente enganado(a). Elspeth se formou em arquitetura depois que terminou sua grande viagem, é mãe solteira, criou com dificuldade seu filho que nasceu poucos anos após ela ter voltado da sua megaviagem em 1983. Até hoje (2012) ela pilota motos.
Elspeth Beard aos 24 anos, comprou uma moto usada BMW R 60/6 Flat-Twin já rodada com 48.000km, a qual pagou na época 900 libras esterlinas, equivalente hoje a aproximadamente R$ 3100.
Para se acostumar com a moto, começou a utilizá-la fazendo viagens pelo Reino Unido, indo até o norte para a Escócia e à Irlanda, depois resolveu ir para a Europa continental, fazendo viagens pelos países próximos a Inglaterra, como França e Espanha.
Ela já tinha terminado três anos de estudos do curso de Arquitetura e nesse período havia também trabalhado e economizado 1000 libras esterlinas, trabalhando atrás de um balcão de um PUB de Londres. Foi quando deu um clique na cabeça dela: queria mais da vida. E resolveu colocar em prática, com atitude, um novo projeto, o de conhecer os continentes da Terra em viagem de motocicleta.
O que hoje para nós pode soar, digamos assim, normal em 2012, já que várias pessoas viajam por ai e temos todos os avanços tecnológicos em nosso favor, em 1980, uma mulher decidir cruzar de moto os continentes da Terra era quase um atestado de insanidade. Hoje sabemos disso, loucos são aqueles que acham que esse tipo de sonho é loucura.
Loucos são aqueles que acreditam que por serem “bem informados com a teoria dos meios de comunicação”, acham que conhecem verdadeiramente o mundo e as pessoas que vivem nele. Isso a gente só aprende quando sai para o mundo, principalmente em viagens terrestres, e de motocicleta é ainda mais intenso e emocionante. Loucos são aqueles que vivem em sono profundo achando que estão acordados.
A primeira etapa da viagem de Elspeth começou em New York/EUA, ela custeou o transporte aéreo dela e da sua moto saindo de Londres. De lá, rodou nos EUA, Canadá e México, voltando para a cidade de Los Angeles, onde enviou sua moto para Sydney na Austrália. Enquanto estava sendo realizado o trâmite de transporte da sua moto (naquela época era mais burocrático e demorado), resolveu esperar, conhecendo a pé a Nova Zelândia, andando por alguns dias.
Depois dos custos que teve para viajar até então e enviar a moto para Sydney, Elspeth ficou sem dinheiro. Ai, em Sydney procurou trabalho. Ficou sete meses trabalhando e vivendo numa garagem de uma casa de uma família que resolveu abrigá-la, fazendo projetos arquitetônicos para pessoas residentes próximas. Foi nesse período também que Elspeth resolveu construir as malas laterais e traseira da sua moto, feitas de alumínio, rebitados e cortados por ela mesma. Até então, ela estava viajando com malas de tecido que tinha providenciado na sua saída de Londres.
Após a chegada da moto, rodou pela Austrália e sofreu seu primeiro acidente, foi em uma estrada de terra perto de Townsville, em Queensland. A moto caiu e ela sofreu escoriações e outros ferimentos, mas não teve nenhum osso quebrado. O capacete da marca “Bell” a protegeu e ela o tem guardado de recordação até hoje, o qual mesmo depois do acidente, continuou sendo utilizado por toda a viagem (não tinha grana sobrando para trocá-lo).
Abalada, mas sempre destemida, ele passou duas semanas no hospital antes de retomar a viagem na estrada, até o norte e costa leste de OZ, emseguida pelo sertão de Ayers Rock e, finalmente, através da planície Nullabor na costa oeste. Lá ela colocou a BMW num barco com destino para Cingapura.
Em Cingapura/Indonésia, sofreu um grave problema, teve todos os seus documentos e pertences de valor roubados, como seu passaporte, documentos do registro de transporte da moto. Teve que voltar para a Inglaterra por onde permaneceu seis semanas resolvendo a questão das segundas vias dos documentos.
Resolvido a questão dos documentos, ela buscou sua moto na Tailândia, prosseguiu até a península da Malásia, pasando também por Bangkok, indo até Chiang Mai no mesmo país (Tailândia), seguindo pelo conhecido Triângulo Dourado na rota terrestre para a Índia.
Foi quando sofreu novo acidente, quando atropelou um cachorro que apareceu correndo saindo próximo de um caminhão, fazendo com que com o seu desvio batesse com a moto numa árvore, isso ocorreu ainda na Tailândia, foi abrigada por uma família pobre de uma pequena cidade, que não falavam uma palavra de inglês e ela nada de tailandês, a comunicação foi por sinais.
A família tailandesa ficou encantada com as histórias que a Elspeth contava sobre sua viagem, conviveram juntos por duas semanas, até que Elspeth se recuperasse do seu acidente, dando comida e hospedagem para ela. Elspeth só ficou chocada quando descobriu que a carne que havia comido na casa era do cachorro que ela havia matado no acidente. Elspeth teve também que arrumar peças do motor da moto que danificou. Depois da experiência com a família rodou adentrando na Índia.
Elspeth já estava mais de dois anos em viagem desde que havia inicialmente partido, foi quando seus pais resolveram visitá-la na Índia, na cidade de Katmandu, seus pais ficaram chocados com a magreza dela. Nessa cidade Elspeth conheceu um holandês que também estava viajando de moto, e juntos rodaram de volta até a Europa, mas antes conheceram o Himalaia. Ambos passaram por uma experiência ruim na viagem, na fronteira da Índia com o Paquistão, ocorreu o assassinato do primeiro ministro indiano, fazendo com que a fronteira ficasse dominada por policiais e guardas do governo indiano, dificultando todos os trâmites de saída do país. A situação ficou caótica e vários ocidentais que estavam na Índia entraram em desespero. Elspeth e o novo amigo holandês simplesmente não conseguiam permissão para sair da Índia, foi quando Elspeth resolveu por conta própria forjar um documento como se fosse do governo indiano autorizando sua saída do país.Ela não estava bem de saúde e sua moto estava com o freio traseiro defeituoso, devido a um vazamento de óleo, além da embreagem da moto que havia parado de funcionar.
Conseguiram atravessar a fronteira para o Paquistão, cruzando o país em direção ao Irã e de lá para a Turquia. No Irã o visto de permissão para ficarem no país foi de poucos dias, assim, logo chegaram na Turquia, faltando poucas horas para o vencimento dos seus vistos.
Elspeth passou algum tempo na Turquia oriental recuperando sua força e reparando sua moto. Quando ela deixou a Inglaterra, era uma mulher jovem, alta, saudável e pesando 65kg. Agora estava pesando apenas 41 quilos.
Agora na Turquia para chegar de volta na Inglaterra, para quem já tinha feito todo o caminho que ela fez por países politicamente complicados e com muitos problemas sociais, cruzar a Grécia e parte da Europa continental rumo ao Reino Unido era simples, ela estava se sentindo em casa. O único desafio, seria atravessar uma rodovia na Iugoslávia, conhecida como “rodovia da morte”, uma estrada de apenas uma pista de cada lado, com muitos caminhões, os quais toda hora ultrapassam um ao outro. Tal estrada tem centenas de cruzes e flores em ambos os lados para lembrar dos mortos em acidentes nos locais.
Mas tudo bem, Elspeth rodou com sua moto até a sua cidade de Londres na Inglaterra, findando a sua viagem. A moto que Elspeth usou para essa viagem existe e é dela até hoje. Ela já teve várias outras motos da BMW, por alguns anos rodou uma GS 1100 R, depois com uma R 80 GS e também uma R 1200 GS. Já fez várias outras grandes viagens, mas nenhuma como a primeira. É sempre assim, todas as viagens de motocicletas, são únicas, diferentes e especiais. Numa das viagens de Elspeth, ela foi acompanhada com um famoso moto aventureiro europeu, Nick Sanders, de Londres para Marrocos, ida e volta.
Depois que Elspeth terminou sua grande viagem entre 1980/83, completou seus estudos de arquitetura e passou sete anos transformando uma torre de água abandonada que adquiriu, em sua casa vitoriana que ficou maravilhosa. Trabalha em tempo integral em Londres e criou sozinha seu filho. Hoje ela é uma arquiteta premiada e reconhecida em toda a Europa.

Elspeth é uma mulher brilhante, isso ninguém pode dizer o contrário.
Fonte: Matéria por Policarpo Jr – RockRiders.com.br
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